“Macunaíma, herói sem nenhum caráter.” Essa frase — que atravessa gerações — ainda ecoa forte quando tentamos entender o Brasil. Mas será que seguimos sendo esse personagem ambíguo, que ri enquanto sangra, que encanta enquanto escapa?
Criado por Mário de Andrade nos anos 1920, Macunaíma é o espelho de um país fragmentado, mestiço, cheio de sabedorias populares, mas também marcado por uma ausência: a de um projeto coletivo, verdadeiro.
E por muito tempo, a elite intelectual tentou “explicar” o Brasil — quase sempre de cima para baixo. Como nos mostra Os Novos Intérpretes do Brasil, essa leitura muitas vezes culpou o povo por problemas que, na verdade, têm raízes bem mais profundas: concentração de renda, exclusão histórica e desigualdades estruturais.
Nos últimos anos, vimos surgir, sim, políticas que ampliaram o acesso à educação, ao consumo, ao reconhecimento — dando nome, rosto e voz a quem sempre esteve fora do centro. Foi o começo de uma virada, um sopro de esperança.
Mas ainda enfrentamos resistências.
Ainda existem vozes que vestem a pátria como fantasia, mas usam o privilégio como armadura. E talvez essa seja a nova pergunta:
Quem tem medo de um Brasil mais justo?
Quem se beneficia quando Macunaíma é mantido como metáfora do povo — e não como denúncia de um sistema?
Macunaíma pode não ter “caráter” — mas teve coragem para resistir. E talvez esteja na hora de devolver a ele o que sempre lhe foi negado: um país que o veja como sujeito da história, e não apenas como folclore.
Esta foi mais uma Quarta do Pensamento, uma pausa para refletir — com profundidade — sobre quem somos, de onde viemos e para onde queremos ir. Se essa reflexão te tocou, compartilhe.
Embora se chame Quartas do Pensamento, nem toda quarta tem sessão — priorizamos compromissos profissionais que hoje sustentam nosso trabalho. Esta coluna, feita com afeto e reflexão, segue como um projeto independente, publicado quando o tempo permite e a inspiração pede passagem. Ah… e também não somos favoráveis aos anúncios invadindo seu espaço de leitura, então, aproveite!
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Referências:
ANDRADE, Mário de. Macunaíma: o herói sem nenhum caráter. Diversas edições, originalmente publicado em 1928.
RODRIGUES, CC., LUCA, TR., and GUIMARÃES, V., orgs. Identidades brasileiras: composições e
recomposições [online]. São Paulo: Editora UNESP; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2014, 257 p.
Desafios Contemporâneos collection. ISBN 978-85-7983-515-5. Available from SciELO Books
<http://books.scielo.org>.