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Sex and the City: Identidade em Alta Velocidade

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Antes de virar ícone fashionista, coluna de comportamento ou manual de sobrevivência afetiva, Sex and the City começou como uma pergunta existencial com salto agulha: “A mulher moderna pode realmente ter tudo?” Nos primeiros episódios da série — antes da estética engolir a ética —, o que vemos são quatro mulheres tentando existir em um mundo onde os antigos manuais foram rasgados, mas os novos ainda não chegaram.

Carrie, Miranda, Charlotte e Samantha encarnam arquétipos femininos tensionados: a romântica, a racional, a libertária e a cética. Mas todas compartilham o mesmo abismo: a busca por uma identidade em um mundo onde tudo muda rápido demais. Como diria Bauman, vivemos tempos líquidos, e essas mulheres são, talvez, algumas das primeiras personagens da TV a experimentar o efeito desse derretimento:

relacionamentos descartáveis, carreiras mutantes, expectativas flutuantes. Ser mulher já não é destino — e escolher entre infinitas possibilidades também pode ser desafiador.

O paradoxo da escolha (com salto alto)

O sociólogo Barry Schwartz já nos alertava: quanto mais opções temos, mais ansiosos ficamos. E essa ansiedade aparece no olhar de Carrie enquanto ela fuma e digita, tentando decifrar homens, amigas e a si mesma. A liberdade cobra caro. Afinal, como aponta Giddens, na modernidade reflexiva, a identidade deixa de ser herdada e passa a ser construída — e isso exige uma constante vigilância de si, um “trabalho biográfico” diário. Ou, como diria Foucault, somos sujeitos de um projeto ininterrupto de autogestão.

Feminismo com vírgulas e silêncios

É claro que a série carrega contradições. Apesar de sua fama feminista, os primeiros episódios ainda orbitam em torno do homem como centro de validação, desejo e narrativa. São mulheres livres, mas ainda guiadas pelo olhar masculino. A crítica feminista não perdoa: onde estão as mulheres negras, pobres, lésbicas, mães solo, periféricas? Angela Davis ou bell hooks talvez assistissem com um misto de irritação e interesse antropológico. O universo de Sex and the City é a Nova York das marcas de luxo, não do metrô lotado. As subjetividades ali são privilegiadas, mas ainda assim aprisionadas.

Entre o passado melancólico e o futuro ansioso

Sex and the City acontece num momento de transição — e é exatamente isso que a torna relevante. O casamento já não é o único destino possível, mas o amor romântico ainda é o prêmio maior. As profissões estão em mutação, mas o sucesso ainda é medido em colunas publicadas e apartamentos desejáveis. A maternidade vira pauta, mas com o tom de “escolha estratégica”. Estamos entre o luto do que fomos e o medo do que seremos. Um tempo sem promessas e com muitas notificações. Sedutor, porém instável.


Pra pensar com pipoca na mão:
  • O que mudou na construção da identidade feminina desde os anos 90 — e o que continua igual?

  • A liberdade de escolha exige um ser autônomo e responsável, caso contrário, emerge o desejo pelo líder totalitário já arcaíco, mas… cuidado, ele está batendo aí na sua porta? Sempre disponível!

  • Como se constrói uma identidade num mundo que não para de exigir versões melhores de você mesma?


Sextou com Pipocas é mais que resenha: é reflexão com acidez, leveza e sagacidade sobre os dilemas do nosso tempo. Se você ou sua empresa querem pensar comunicação com profundidade, propósito e um olhar atento às transformações culturais, conte com a ToMoveCom.

Embora se chame Sextou com Pipocas, nem toda sexta tem sessão — priorizamos compromissos profissionais que hoje sustentam nosso trabalho. Esta coluna, feita com afeto e reflexão, segue como um projeto independente, publicado quando o tempo permite e a inspiração pede passagem. Ah… e também não somos favoráveis aos anúncios invadindo seu espaço de leitura, então, aproveite!

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Referências bibliográficas:
  • BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.

  • GIDDENS, Anthony. Modernidade e identidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2002.

  • FOUCAULT, Michel. A hermenêutica do sujeito. São Paulo: Martins Fontes, 2010.

  • SCHWARTZ, Barry. O paradoxo da escolha: por que mais é menos. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004.

  • DAVIS, Angela. Mulheres, raça e classe. São Paulo: Boitempo, 2016.

  • HOOKS, bell. O feminismo é para todo mundo: políticas arrebatadoras. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 2018.

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